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A romantização do termo "pãe": um debate necessário

A romantização do termo "pãe": um debate necessário

Tema traz à tona a necessidade de um olhar mais crítico e profundo sobre a realidade das mães solo.

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Nos últimos anos, a expressão "pãe" ganhou popularidade nas redes sociais e em conversas do dia a dia. O termo, uma junção de "pai" e "mãe", é usado para identificar mulheres que criam seus filhos sozinhas, assumindo as responsabilidades tanto maternas quanto paternas.

A palavra "pãe" surge como uma tentativa de valorizar as mães solo, que muitas vezes enfrentam desafios enormes para criar seus filhos sem a presença de um parceiro. Essas mulheres acumulam funções e precisam lidar com todas as demandas emocionais, financeiras e logísticas da criação dos filhos. O termo busca reconhecer e valorizar essa dedicação.

“Na verdade, romantizar é uma concepção de uma sociedade que vem impondo padrões bem irrealistas às mulheres que, se não alcançados, podem acarretar grandes impactos na saúde mental dessa mulher”, explica a psicóloga Ana Novais.

Segundo Ana, atualmente, o que mais pesa na sociedade é essa pressão, que vem se tornando um mito, uma bandeira de militância de que a mãe solo é incrível e de que ela dá conta, e que ela tem que ser multitarefas. “Isso está criando uma sociedade em estado constante de Bournout, porque essas mães estão sobrecarregadas, exaustas, e não é sobre os filhos. O peso não vem da maternidade, a sobrecarga vem dessa romantização de que a mulher ‘tem que’”.

“Tem que dar conta, tem que trabalhar em múltiplas funções, tem que ser fazedora das coisas, tem que ser reativa. Ela deixou de ser uma mulher feminina, deixou de ser uma mulher ativa, ela perdeu a sua essência. No consultório, muitas mulheres já não se reconhecem, porque não sabem mais o que é importante para elas, não conseguem se enxergar como mulheres”, complementa a especialista.

A realidade das mães solo

Dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) indicam que o número de famílias monoparentais lideradas por mulheres tem crescido no Brasil. Essas mulheres enfrentam não apenas a jornada dupla de trabalho, mas também desafios como a discriminação no mercado de trabalho, dificuldades financeiras e a falta de apoio emocional.

De acordo com Ana Novais, essa urgência de exercer vários papeis, pode ser um pedido de ajuda legítimo, de que é a hora de “desromantizar” essa maternidade e colocar esse homem não apenas no lugar de provedor, mas de cooperador.

“Essa romantização vem da negligência, da ausência de responsabilidade desse genitor, que pode ser por variadas causas, como rompimento da relação, negação da paternidade, e tantos outros fatores. Mas esse homem precisa lembrar que ele também TEM QUE fazer muitas outras coisas; e que essa ausência dele, além de sobrecarregar essa mãe, vai deixar uma lacuna na criação desse filho. Nós poderíamos, inclusive, falar também sobre o genitor que está dentro de casa, mas que negligencia a função tal qual aquele que está fora”, reafirma a profissional.

A importância do debate

“Quando essa mãe se desdobra para exercer vários papeis e para atender a rotina que envolve trabalho, casa e educação dos filhos, vai chegar uma hora, que esses pratos vão quebrar, porque é impossível equilibrar tantos pratos sozinha. Na maioria das vezes, ela vai negligenciar a própria saúde, vai deixar de lado os cuidados consigo mesma; isso vira um ciclo de esquecimento, que ela pode perceber ou não. Ela sempre será o último lugar de sua prioridade”, alerta a psicóloga Ana Novais.

Segundo a terapeuta, “esses sentimentos são tão intrínsecos, tão naturais a essas mulheres que, em muitos casos, elas nem notam esses sintomas de sobrecarga”. “Muitas mulheres levam isso no automático e naturalizam toda essa dinâmica. Culturalmente, ela é ‘obrigada’ a se virar; isso se torna ainda mais pesado e ainda mais reforçado”.

Para finalizar, Ana destaca que existe uma necessidade urgente de separar a mulher da mãe. “É preciso entender que existe uma mãe e existe uma mulher. É aí que surgem as redes de apoio para tentar aliviar essa sobrecarga; mas, infelizmente, muitas mulheres não têm essa rede de apoio. E nesse contexto, surge a pergunta: onde está o pai?”.

Redação Elas em Pauta

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